segunda-feira, 7 de setembro de 2009

QUE SAUDADES DAS CARTAS DE AMOR...

"Exma. Senhora D. Ophélia Queiroz:

Um abjecto e miserável indivíduo chamado Fernando Pessoa, meu particular e querido amigo, encarregou-me de comunicar a V. Ex.ª — considerando que o estado mental dele o impede de comunicar qualquer coisa, mesmo a uma ervilha seca (exemplo da obediência e da disciplina) — que V. Ex. ª está proibida de:

(1) pesar menos gramas,

(2) comer pouco,

(3) não dormir nada,

(4) ter febre,

(5) pensar no indivíduo em questão.

Pela minha parte, e como íntimo e sincero amigo que sou do meliante de cuja comunicação (com sacrifício) me encarrego, aconselho V. Ex.ª a pegar na imagem mental, que acaso tenha formado do indivíduo cuja citação está estragando este papel razoavelmente branco, e deitar essa imagem mental na pia, por ser materialmente impossível dar esse justo Destino à entidade fingidamente humana a quem ele competiria, se houvesse justiça no mundo.

Cumprimenta V. Ex. ª

Álvaro de Campos

Eng. Naval"


Que tristeza esta de já não haver cartas de amor... Restam-nos as sms e - quando temos sorte - um ou outro e-mail inspirado. Às vezes bate-me a saudade dos tempos em guardava em baús os recados e mensagens, os postais e os poemas. Era tão bom receber missivas inesperadas com palavras doces e tolas, que eram furiosamente rasgadas nos momentos tristes e logo reconstruídas com fita-cola se as pazes eram feitas. Quem quer agora choramingar sob e-mails ou como podemos rasgar sms?!!! Perdeu-se tanto romantismo com o fim das cartas de amor que, às vezes nem lamechas, já apetece ser...


"Bebezinho do Nininho-ninho:

Oh!

Venho só quevê pâ dizê ó Bebezinho que gotei muito da catinha dela. Oh!

E também tive munta pena de não tá ó pé do Bebé pâ le dá jinhos.

Oh! O Nininho é pequenininho!

Hoje o Nininho não vai a Belém porque, como não sabia se havia carros, combinei tá aqui às seis ho'as.

Amanhã, a não sê qu'o Nininho não possa é que sai daqui pelas cinco e meia. [desenho de uma meia] (isto é a meia das cinco e meia).

Amanhã o Bebé espera pelo Nininho, sim? Em Belém, sim? Sim?

Jinhos, jinhos e mais jinhos.

assinatura de Fernando Pessoa"



Sem comentários:

Enviar um comentário