Ninguém duvida já que o modelo tradicional de família é incapaz de responder aos desafios decorrentes da evolução social e económica. Um casamento (quando ocorre) não dura para a vida, os dois elementos do casal normalmente trabalham fora, as mulheres ganharam ascendência económica e social e as crianças em casa rareiam ou - muitas vezes - quando existem são uma amálgama de "meus filhos", "teus filhos" e nossos filhos.
Perante estes factos muitos são os que erguem a voz na necessidade de instituir novos modelos de família.
O que é certo é que tanto o modelo tradicional como os eventuais novos modelos têm subjacente a disponibilidade para criar um projecto a dois. E não é um qualquer projecto, trata-se de um projecto de carácter afectivo (eventualmente com repercussões patrimoniais). Daí que mais do que procurar novos modelos talvez fosse melhor entender o que se passa com o ser humano e a forma como encara os seus afectos!
Senão vejamos...
Quando partimos para um projecto profissional normalmente vamos confiantes que vai resultar e empenhamo-nos profundamente para alcançar o sucesso, mas entramos num relacionamento com a ladaínha ensaiada "se não resultar, parto para outra; porta da rua, serventia da casa; eu sei que não vai resultar mas entretanto..."
Em qualquer parceria profissional definimos claramente os objectivos e as tarefas que cabem a cada um, mas numa relação afectiva sobrevivemos ao dia a dia, com muito pouco diálogo, muita omissão (ou até mentira) e entramos em constantes "lutas pelo poder", seja para demonstrar que somos mais bem sucedidos ou apenas pelo telecomando ou pela melhor poltrona.
No âmbito de um projecto profissional colaboramos para o sucesso do resultado final mesmo que odiemos o tipo com quem somos obrigados a colaborar, mas no âmbito de uma relação amorosa - notem bem, falo de casos em que há amor - somos egoistas, queremos o bem-estar do indíviduo em detrimento do bem-estar do casal e, muitas vezes, somos motores da ruptura, implacáveis com os defeitos da "outra metade" e intolerantes com as suas falhas.
Será assim possível construir uma vida a dois?
Já para não falar das regras básicas de educação e sã convivência que parecem estar a ficar perdidas...
Quantas vezes não assistimos a pessoas que olhando para os telemóveis e verificando que são a(o) outra(o) optam por não atender? Ou atendem e mentem descaradamente dizendo que ainda estão a trabalhar em plena esplanada? Quantas vezes as pessoas que contam ao chefe cada passo que dão, são aquelas que são incapazes de avisar a pessoa com quem se relacionam que se vão ausentar? E as baterias que se acabam sempre no momento mais oportuno ou a rede que é sempre deficitária quando é mais conveniente?
É claro que o facto de nós mulheres nos termos habituado a competir profissionalmente e acabarmos por - insconscientemente - levar essa competição para casa, transformando os homens nuns seres apáticos, aos quais depois não achamos qualquer graça, não ajuda... Nem tão pouco somos ajudados por essa prática masculina de correr atrás de tudo o que é fácil para não serem confrontados com a possibilidade de rejeição ou insucesso.
Os erros de parte a parte sucedem-se nesta azáfama em que vivemos e parece que esquecemos o mais importante: o ser humano precisa de afectos verdadeiros. É certo que dá trabalho, exige disponibilidade, abdicação, mas no balanço final as compensações superam (e muito) as eventuais perdas. Como diz o povo, "Deus dá-nos as nozes mas não as parte". Uma relação bem sucedida é possível, mas nada se consegue sem esforço e é esse esforço que aparentemente deixámos de conseguir fazer...
Isto tudo porque me falaram de "filhos", tema que para quem tem entre os 30 e os 40 anos se torna um calvário. Não há quem não nos fale disso, pergunte para quando e até chegam à célebre frase "coitadinhos dos paizinhos, iam gostar tanto de ser avós".
Pois iam!!! Acontece que, para mim, filhos não são projectos individuais, filhos são o resultado de um projecto a dois que - por ser tão especial - nos faz ter vontade de nos juntarmos muito, muito, muito e assim "fabricar" o terceiro elemento (com sorte, trará o melhor de cada um de nós como herança genética e seremos capazes de, juntos, o ajudar a ser um ser humano formidável). Filhos devem chegar quando não se imagina possível viver sem uma prova viva (criança) do amor do casal... Infelizmente, nos dias que correm (e especialmente com o avançar da idade) a probabilidade de construir um projecto a dois, e assim nascer o desejo de nos transformarmos em três ou quatro é cada vez mais reduzida.
Filhos? Até hoje nunca me apeteceu mas sim, claro que ficaria muito feliz se tivesse filhos pois seriam a prova de que havia encontrado a "minha metade", o meu companheiro, o meu amor "eterno" e com ele construído a nossa família!
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